sábado, 12 de novembro de 2011

Entrevista com Eduardo Lemos

Eduardo Lemos: "Eu acho que os postulantes da oposição têm que ser movidos por um projeto político coletivo. Interesses pessoais não devem existir. Isso é indiscutível e inegociável". 
O médico Eduardo Lemos formalizou o fim da aliança com o prefeito Flávio Veras, entregando todos os cargos do PSB e seguindo caminho direto para a oposição. Nessa entrevista exclusiva para o blog Macau em Dia, ele relata as razões que levou ao rompimento e seus planos para uma eventual candidatura a prefeito de Macau.

O jornalista Alex Gurgel foi recebido pelo médico em sua clínica, em Natal, para um bate-papo descontraído sobre a atual conjuntura política de Macau e o posicionamento da oposição diante desse novo fato político. Com a simpatia de sempre, o doutor Eduardo Lemos abriu seu coração e soltou o verbo.

Oficialmente, o senhor protocolou o afastamento do seu partido (PSB) da aliança que tinha com o PMDB macauense. Agora, o senhor segue o caminho da oposição?
Nossa saída do Governo de Flávio era uma situação esperada em função de algumas situações administrativas e políticas que nós não concordávamos. Isso significa dizer também que o PSB vai caminhar num sentido oposto ao do Governo Flávio, tomando uma postura de oposição, um caminho natural de quem discorda. Uma oposição que será feita de uma forma serena, tranquila, sem grandes sobressaltos ou radicalismos.

Nas últimas eleições, o senhor deu apoio total ao candidato Flávio Veras para que ele fosse eleito, inclusive indicando o vice. Teoricamente, havia uma esperança que o prefeito Flávio Veras apoiasse politicamente o senhor como candidato a prefeito de Macau nas próximas eleições. Como ele preteriu o seu nome em favor de outra candidatura, esse fato ajudou o senhor a tomar essa decisão?
A decisão do afastamento não se baseou num fato isolado. Não foi apenas uma questão política. Já estava acontecendo algumas situações administrativas na Prefeitura de Macau que nós do PSB não concordávamos e não aceitávamos. As secretarias que o nosso partido tinha no Governo Flávio, Educação e Agricultura e Pesca, não tinham condições de fazer o que nossos gestores pretendiam, que era um trabalho mais abrangente e com melhores resultados para a população. É preciso entender que os secretários são auxiliares do prefeito. O ordenador das despesas e quem define onde será gasto a verba. Nossas secretarias ficaram engessadas, sem condições de trabalho. Era uma coisa que nos inquietava muito. Inclusive, alguns movimentos sindicais da cidade achavam que havia um propósito do próprio chefe do executivo para boicotar a administração dessas secretarias como forma indireta de desgastar a imagem do PSB perante sociedade e a cidade de Macau. Nós queríamos que as secretarias dessem suas contribuições à sociedade. O PSB não foi para o Governo Flávio com uma visão fisiológica do governo pelo governo.

O que o senhor citou é a discordância administrativa. E quanto às divergências no campo político?
Eu e meu partido não concordamos com projetos pessoais. Os projetos políticos têm que ter uma grandeza universal coletiva e não projetos de cunho pessoais. Esse tipo de projeto você tem em sua vida particular e privada. Eu até entendo e aceito. Mas, no âmbito político, o projeto tem que ser coletivo. O que se desenha hoje na cidade é uma tendência muito forte de uma candidatura da situação. No meu entender, essa não é uma candidatura do PMDB, mas sim uma candidatura pontual, pessoal do prefeito Flávio Veras. Uma candidatura pessoal enseja num projeto pessoal que nós não concordamos de jeito nenhum.

Como o senhor mesmo relatou falando da discordância administrativa, as duas secretarias citadas, tanto a Educação e Agricultura e Pesca, foram engessadas pelo prefeito. O senhor se sentiu desprestigiado com essa atitude do prefeito?
A aliança quando foi feita tinha o caráter eminentemente político. Foi uma aliança feita a partir de Natal que foi estendida para vários municípios, que já vinha de um projeto nacional, que pudesse unir no único palanque toda a base do Governo Federal. Em Natal, durante as eleições de 2008, o PSB não teve candidatura e o PMDB não teve candidatura para se juntar em torno da candidatura de Fátima Bezerra a prefeitura de Natal. Esse projeto se se espraiou até Macau. Naquela ocasião, eu como liderança maior do PSB em Macau, não pude disputar a eleição por questões pessoais. Depois dessa minha decisão, a executiva municipal do PSB usou a mesma regra política de Natal em Macau que era juntar a base aliada do Governo Federal.

Doutor Eduardo Lemos do PSB.
E nessa aliança entre o PSB e o PMDB, em Macau, teve os desdobramentos administrativos?
Sim, claro. O PSB foi convidado pelo PMDB a dar sua contribuição no Governo do novo prefeito através das duas secretarias (Educação e Agricultura e Pesca). Já que nós fomos convidados para fazer parte do Governo, que fosse dada a devida condição para que o trabalho fosse efetivamente realizado. Você imagina uma secretaria com a importância da Educação para o município de Macau sem condições de trabalho. O trabalho fica inócuo e não rende resultados. O secretário não consegue fazer nada se não tiver o apoio total do chefe do executivo. Imagine os alunos municipais passarem quase um semestre inteiro sem merenda escolar! Isso nos doía profundamente. Além do sentimento de não poder resolver. Os pleitos dos secretários eram feitos e levados ao prefeito em documentos. Inclusive, a secretária Mércia Teixeira foi a todas as escolas do município e fez um relatório circunstanciado com todos os diretores sobre as necessidades de cada escola. Esse relatório foi transformado num documento que foi entregue ao prefeito. A dificuldade em trabalhar impediu muito o avanço dos projetos dos secretários e não permitiu que o partido fizesse um bom trabalho.

Como médico, seria natural que o senhor pudesse assumir a Secretaria de Saúde. Essa situação não foi conversada na época?
Boa pergunta. Uma oportunidade de fazer alguns esclarecimentos importantes. Quando o PSB foi convidado a participar do Governo em janeiro de 2009, já com o prefeito empossado, o prefeito Flávio Veras sinalizou a possibilidade da Secretaria de Saúde para nosso partido. Eu confesso que naquele momento, eu fiquei extremamente satisfeito porque é minha ceara, um campo que atuo a quase 30 anos como médico, como diretor de empresas médicas e pelo amplo conhecimento que tenho no setor, além de conhecer colegas médicos que podem trabalhar, era a grande oportunidade que Macau teria de ter uma renovação na Saúde. Mas, o prefeito sinalizou, mas recuou e não nos deu essa secretaria ao nosso partido. Se a Saúde tivesse conosco, e se ele tivesse dado a devida condição de trabalho, a Saúde em Macau não viveria de forma lamentável como hoje se apresenta que não atende as perspectivas da cidade.

Nessas alturas dos acontecimentos políticos, todos os cargos do PSB estão entregues ao prefeito e a recomendação é que todos os militantes e partidários do Socialistas deixem a Prefeitura de Macau?
Eu tive uma reunião com o prefeito na sexta-feira, dia 04 de novembro, quando colocamos todos os cargos a disposição. A partir daquele momento, nós estávamos em caminhos opostos, portanto, os cargos eram do prefeito e estavam sendo entregues. Na segunda-feira, nós protocolamos um documento na Prefeitura de Macau reafirmando a decisão do PSB. Os secretários têm que entregar seus cargos. Mas, evidentemente tem que se esperar um sucessor para que não se entregue a titularidade de uma secretaria às traças. Seria um ato irresponsável de nossa parte. Nós esperamos que o prefeito faça a nomeação, o mais rápido possível, dos nomes para substituir nossos secretários. Os cargos estão à disposição do prefeito. A permanência de alguém nos cargos deixa de ser minha responsabilidade e sobre essas pessoas o partido não responderá. A orientação do PSB é entregar todos os cargos.

Agora, o senhor assume sua pré-candidatura a prefeito de Macau?
De certa forma, essa pré-candidatura já existia. Eu tenho pesquisas quantitativas que sinalizam uma posição confortável de meu nome. Eu sinto que existe um sentimento muito forte na cidade por mudanças e o PSB não pode recuar e tem que ter candidatura própria. Então, em cima dessas situações e dessas ponderações que estão sendo feitas, nós vamos tentar disputar as eleições de Macau.

"O que me move a querer ser prefeito de Macau é o desejo de fazer alguma coisa contemporânea. Chega de coisas atrasadas". 
Mas, seu nome deverá ser homologado como candidato a Prefeitura de Macau pelo PSB?
Serei candidato, sim. Eu nunca fui um homem impositivo. Eu sempre fui um homem de diálogo. Eu só não posso me deparar com situações aberrantes. Posso dar um exemplo. O prefeito Flávio Veras sugeriu que nós ficássemos todos juntos agora e num futuro próximo, em março de 2012, faria uma avaliação para ver quem seria o melhor candidato. Mas, veja essa situação. Ele seria o juiz desse processo. Como juiz ele estaria altamente contaminado para tomar a decisão e não seria imparcial. Ele já está com essa candidatura nas ruas a mais dois anos. Ele não tem coragem de dizer que é uma candidatura, mas todo mundo sabe que está por trás dela. Eu não participaria de uma farsa. Eu agradeci a proposta e disse que seria candidato a prefeito de Macau a partir daquele momento.

O senhor acha que esse é o momento para reunir a oposição? Há um sentimento dentro dos candidatos oposicionistas de que quem estiver melhor nas pesquisas será apoiado pelos outros candidatos. O senhor comunga com essa mesma opinião?
Eu acho que os postulantes da oposição têm que ser movidos por um projeto político coletivo. Interesses pessoais não devem existir. Isso é indiscutível e inegociável. Eu não sento em mesa com projetos de interesses pessoais. Um projeto coletivo, que atenda a expectativa da cidade e que haja uma renovação política, que sempre defendi, podendo agregar e trazer benefícios para a cidade, eu sentarei para discutir. Dentro de um sentimento político, eu estou disposto a conversar com aqueles que querem abraçar uma causa coletiva para Macau.

Doutor Eduardo, afinal, o que lhe motiva a querer ser prefeito de Macau?
Essa situação que vou colocar não é soberba. Mas, eu construir uma vida pessoal. Eu nunca fui um aventureiro, eu nunca fui um pára-quedista e nunca fui homem de jogos escusos ou artimanha. Eu sempre edifiquei minha vida com muito trabalho. E o que eu abracei que foi minha profissão, eu fiz com muito zelo. Hoje, eu acho que consegui vencer, dentro do que faço, dentro da minha vida profissional. Existe ainda uma lacuna na minha alma que é o desejo de e o sentimento de mudar Macau. Seria muito cômodo pra mim, ficar onde estou e continuar tocando minha vida com meus filhos e exercendo a medicina como eu sempre fiz. Eu ainda invisto muito em conhecimento, participando em congressos e comprando livros atualizados. Sou uma pessoa que procura se aperfeiçoar na minha profissão, se atualizando no que há mais de moderno na medicina. Mas, existe essa lacuna na alma que não foi resolvida. Eu tenho um grande afeto por Macau. O que me move a querer ser prefeito de Macau é o desejo de fazer alguma coisa contemporânea. Chega de coisas atrasadas. A gente tem que enxergar Macau no futuro. Gostaria muito de ter a oportunidade de deixar um legado para futuras gerações.

E qual é o futuro de Macau?
Algumas práticas políticas de Macau são antigas, que já poderiam ter sido cortadas. Se, em 2004, a gente tivesse ganhado a eleição. Se a eleição não tivesse sido arrancada, eu acho que a gente estaria vivendo um momento político completamente diferente, com pessoas pensando de uma forma mais coletiva. Nunca se fez um planejamento para Macau em longo prazo. Esse petróleo que tem em Macau é finito. Quando o petróleo acabar, o povo vai viver de que? Ninguém planejou nada para a cidade, uma renda para o povo e qualificação profissional. A riqueza que Macau tem hoje é restrita aos cofres públicos. Essa riqueza não chega ao povão. É muito bonito você ler nos jornais que “Macau é campeã de arrecadação de royalties”. Mas, qual o resultado prático desse dinheiro na cidade? Nada. As grandes obras que são realizadas em Macau atualmente não têm o DNA da Prefeitura de Macau. As obras estão sendo realizadas com dinheiro do Governo do Estado ou do Governo Federal como é o caso das obras de saneamento básico. O que foi feito pela Prefeitura com esse volume financeiro? Esse dinheiro não chega para a população e a cidade continua com a saúde precária, a pobreza é uma coisa aviltante, as drogas estão tomando conta dos jovens, não há qualificação para jovens, a cultura não existe, os alunos vão pra escola e não tem merenda. Meu desejo é mudar essa situação desprezível e preparar a cidade para um futuro que virá.

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