segunda-feira, 18 de abril de 2011

Um Dia para Benito Barros

Regina Barros concedeu entrevista ao Macau em Dia falando sobre sua amizade com Benito Barros e como será o "Dia de Benito", uma homenagem ao grande Imperador da Casqueira.
 por Alex Gurgel | jornalista
alexgurgel@com-texto.com

Capitaneado pelas jornalistas Regina Barros e Dorotéa Dantas, um grupo de amigos resolveu fazer uma homenagem ao saudoso Benito Barros, durante todo o dia 21 de abril, data que se comemora seu natalício. O convite imperial para a grande festa já foi espalhado por todo Império da Casqueira e o povo conclamado a participar na Praça da Conceição. Na ocasião, ainda serão homenageados o Padre Penha e o Maestro Castro.

No início das nossas trocas de e-mail para a realização de um texto sobre o Dia de Benito Barros, a jornalista Regina Barros foi logo alertando: “Alex, antes de qualquer coisa quero dizer que não tenho muita intimidade com o lado de cá do balcão. A condição de ‘entrevistada’, pra ser bem sincera me deixa até um pouco intimidada, mas, a causa é nobre e vamos lá. Do meu baú de lembranças e saudades só prometo sinceridade”.

Regina Barros ver os jornalistas como contadores de histórias. Desde criança ela gostava de ouvir e contar histórias. No movimento de Bandeirantes, em Macau, ela costumava ser indicada como “relatora” da patrulha para redigir as atas de reuniões e acampamentos. “Acho que aí já morava a jornalista que só foi tomar consciência disso alguns anos depois na adolescência, graças ao Padre Penha, cuja memória também reverencio”.

Segundo Regina, certa vez, Padre Penha ouviu a própria Regina dizer que faria vestibular para arquitetura e contestou com veemência afirmando que sua vocação era o jornalismo. “Pelo menos nisso segui a orientação dele e fui cursar na UFRN em meados dos anos 70. Graças a Deus, Alex, pois ruim de cálculo como sou se fosse arquiteta muito projeto já teria desabado por aí”, completou.

Regina Barros passou pelas redações dos jornais Tribuna do Norte e Diário de Natal. Também atuou na rádio Salinas, em 1988, junto com Vilma Pinheiro, onde elas criaram um programa que marcou uma época, se chamava “Mulher em Debate”. Em 1993, na companhia de Bosco Afonso e Degas, foi criado o Jornal de Macau que também marcou a vida da cidade.

Hoje, Regina Barros está trabalhando na Agência de Comunicação da UFRN.  “Sinto muito prazer no exercício do jornalismo, isso corre nas veias, você sabe disso. Costumo dizer que sou uma jornalista provinciana, mera contadora de histórias, que busca ser fiel aos fatos e tem plena consciência da responsabilidade social que deve nutrir a essência do bom jornalismo”, disse Regina.

Conte como é esse amor por Macau que você nutre.
Regina Barros: Nas pequenas cidades do interior havia um costume antigo de enterrar os umbigos dos recém-nascidos nos currais para trazer sorte aos bebês. Penso que o meu foi enterrado tão profundamente no curral de seu Luiz Bezerra que já saí de Macau várias vezes, mas Macau nunca saiu de mim. Minha vida conta muitas idas e voltas para a Ilha que me viu nascer. Como se fora uma árvore acredito que devemos florescer onde Deus nos plantou. Sou bastante apegada à cidade, ao seu povo e suas tradições. Fico feliz com suas conquistas, suas alegrias e sofro bastante com suas dores, suas derrotas. Às vezes me desencanto, também. Hoje, com uma carga maior de saudade volto a cantarolar a ‘marcha regresso’, disposta a viver nova temporada em minha cidade. Na bagagem, muitas idéias, alguns projetos. Se Deus permitir tenho algumas missões ainda a cumprir. É que chegou a hora de ficar mais perto da minha mãe, Dona Rosarinho, por outro lado, não gostaria de ver o sonho do Império da Casqueira cair na vala comum do esquecimento. Sobre isso, vamos ver o que é possível ser feito.

Descreve um pouco da sua história ao lado de Benito. Como o conheceu?
Regina Barros: Minha amizade com Benito nasceu nos dias da feliz infância na Rua Benjamin Constant. Nossas casas eram vizinhas e partilhamos as mesmas salas do Grupo Escolar Duque de Caxias. Naqueles anos, aprendemos a gostar da política com as visitas do grande líder Aluízio Alves que se hospedava no sobrado de Seu Afonso Barros, pai de Benito. Ali ensaiamos os primeiros discursos em palanques improvisados defendendo a bandeira verde da cruzada da esperança. Depois, ele foi estudar em Recife, eu em Natal, nos distanciamos. Voltamos a nos encontrar no final dos anos 70, outra vez em Macau, no Campus Avançado da UFRN. Em 1980 participamos da criação do PMDB, ainda na luta contra a ditadura. Em 1982, na campanha histórica de João Evangelista para prefeito, me empenhei na eleição dele para vereador e a história é longa. O fato é que, desde sempre, construímos uma amizade muito afinada, muito próxima. Isso não quer dizer que concordávamos em tudo, não, quem nos conhece sabe que tínhamos verdadeiros ‘pegas’, que felizmente logo eram superados. Muitos ainda acreditam que somos parentes em razão da afinidade e do mesmo sobrenome. Gosto de esclarecer, genealogicamente não somos da mesma família. Já nossas almas, eu creio, certamente são irmãs.

Como ele vivia? Ele gostava de que? O que detestava? Com que ele ficava triste ou alegre?
Regina Barros: Desculpe, mas ainda não é fácil falar ou escrever sobre Benito depois que ele partiu. É estranho, sei lá, parece que estou travada, bloqueada, é difícil. Um dia isso será superado e aí pretendo resgatar a história desse ser humano fantástico, filho digno de Macau que amou sua terra como poucos e viveu franciscanamente distribuindo generosidade em cada esquina.  Por enquanto posso dizer que ele, embora pacífico, era um bravo que não temia a vida, cortejava a morte e esnobava a solidão. Era dono de idéias brilhantes, revolucionárias, tão pouco compreendidas. Parecia rude, mas era um grande sedutor. Benito sabia amar intensamente. Detestava a mentira e a hipocrisia, abominava a desonestidade, se entediava com a mediocridade e se amargurava com a traição.

Numa terra onde tem intelectuais do gabarito de Gilberto Avelino e Vicente Serejo, qual o legado deixado por Benito Barros?
Regina Barros. Benito era uma reserva intelectual em nossa Macau e no Rio Grande do Norte. Sua profunda paixão pelos livros é reconhecida bem além das fronteiras do velho moinho. Ele consumia centenas de livros que chegavam dos quatro cantos do mundo e se emocionava com cada um deles, como se fossem filhos. Deixou uma biblioteca rara de valor inestimável. A partir de 1997 se lançou como autor. Naquele ano, sofregamente escreveu a primeira edição de ‘Macauísmos’ após uns poucos meses de exaustiva pesquisa no Fórum Municipal. Gostou da experiência, embora tentasse reduzir a relevância do próprio trabalho, num gesto bem típico do seu espírito modesto. Em 1998, num rasgo de genialidade criou a Imperial Casa Editora da Casqueira, que além da sua própria obra, revelou outros talentosos escritores macauenses, que sem a proteção do ‘Imperador’ dificilmente conseguiriam publicar os seus livros. Esta é uma inquestionável botija que Benito deixou sobre a terra. Mas não foi só isso, Alex.  Para um pequeno documentário que estou fazendo sobre Benito o professor Ivonildo Rêgo,  reitor da UFRN, deu uma declaração que passo em primeira mão para você. “Reconheço que a manutenção da presença da UFRN em Macau se deve fortemente ao esforço de Benito. Ele estava a todo o momento insistindo, lutando, ajudando a fazer o Campus de Macau, que esteve durante algum tempo praticamente desativado, e graças à luta de Benito e à sua presença em Macau a Universidade pode retornar em outra dimensão, prestando incomensurável serviço a toda região”, afirmou o reitor. Esse, portanto, é outro patrimônio que ele deixou em solo macauense. No entanto, embora reconhecendo o valor da sua obra, do seu acervo literário e da sua luta pelo Campus de Macau, para mim a maior herança que Benito Barros deixa em Macau é o seu exemplo de vida íntegra pautada na simplicidade, autenticidade, honestidade, generosidade, solidariedade e espírito público. Esse é o legado que nem a traça ou a maresia haverá de corroer.

Qual a importância de Benito para Macau?
Regina Barros: Em minha opinião quem melhor traduziu a importância de Benito nesta vida foi Padre Murilo durante seu velório no Lions Clube. Naquela tarde triste, acinzentada, fiquei comovida ao ouvi-lo dizer: “A Revolução Benito está a 300 anos de nós. Talvez daqui a trezentos anos os macauenses compreendam os sonhos, a voz, o grito, a ação, o trabalho, a inteligência e a poesia de Benito Barros”. Grande verdade! Como amiga admito que não foi tão fácil compreender claramente as idéias de Benito. Confesso que muitas vezes eu me esforçava muito para chegar perto da sua genialidade que alcançava um patamar muito além da minha limitação. Digo, sem receio nenhum de estar exagerando, ele era simplesmente fantástico e gastava toda a sua energia vital, seus bens materiais ‘conspirando’ a favor de Macau. A cidade inteira é testemunha disso.

Passado quase cinco meses de sua morte, qual o sentimento Benito deixou em Macau e como as pessoas o ver?
Regina Barros: Sobre isso recorro às palavras do nosso amigo Horácio Paiva, outra reserva moral e intelectual de Macau. Logo após a morte de Benito ele publicou: “A intensa comoção provocada pela morte do inesquecível amigo Benito Barros mostrou o quanto ele era querido em nossa comunidade. Suponho que mais do que ele próprio sabia. A sua dimensão social e política agigantou-se. Provou que a sua voz - denunciando erros, injustiças e hipocrisias políticas - não era uma voz que clamava no deserto. A cidade, que nem sempre se manifestava, escutava-o em silêncio, mas atentamente. Se não queria o confronto, se não adotava a polêmica de suas posições - por acomodação ou por parecer-lhe inadequadas, ora certas, ora erradas -, entendia, porém, necessário o açoite de seu agitado e profético clamor”. Horácio tem razão. Embora nem todos reconhecessem ele era singular porque não se rendia diante de nenhuma forma de poder autoritário, dispensava favores e jamais se deixou corromper.  Além disso, diferente de nós, estava sempre de plantão em Macau, ajudando sua gente, elevando sua voz no combate às injustiças cometidas principalmente contra pessoas indefesas ou contra ações danosas ao meio ambiente, isso até o último dia de sua vida. E agora, quem há de? Talvez por isso, após sua morte, em cada esquina ouço uma história bonita, um soluço, uma dor de quem perdeu um filho, um pai, um irmão, um amigo, o herói preferido.

Se o Império da Casqueira não existisse seria preciso inventá-lo somente para Bena I reinar absoluto?
Regina Barros: Vou lhe dizer uma coisa Alex, sou uma grande admiradora de Vicente Serejo. Suas crônicas são belíssimas. Então, quando ele escreve sobre Macau me deixa toda arrepiada. Mesmo saindo da cidade ainda criança consegue ainda hoje traduzir como ninguém a essência dos dias antigos na ilha que amamos. E foi Serejo que - sem nunca ter encontrado Benito pessoalmente - traduziu para nós a idéia da criação do Império da Casqueira. “Ele não cabia no mundo. Era maior. Por isso criou o Império da Casqueira, reinado para ele guardar os seus sonhos e as suas utopias”.

A Casqueira era a Pasárgada de Benito?
Regina Barros: Digo que muitas pessoas não saem de Macau por falta de oportunidade, não era o caso de Benito. Ele poderia ter vivido em qualquer lugar deste planeta, morar e morrer em Macau foi uma escolha dele em razão da intensa paixão que sentia pela cidade. No entanto, embora o admirasse, a sociedade macauense não o compreendia e de certa forma o rejeitava. Em nossas conversas chegávamos à conclusão de que muitos queriam o seu apoio desde que ele ficasse à distância quando os objetivos eram alcançados. Isso doía muito algumas vezes. A verdade é que Macau não soube aproveitar o potencial de Benito. Então, para nos salvar dessa angústia diante da impotência para resolver as grandes aflições da cidade, criou o Império da Casqueira, refúgio paradisíaco onde tinha total liberdade para buscar a felicidade bem longe da hipocrisia e do preconceito. Para esse refúgio, com boa dose de ironia, claro, levou os amigos com quem distribuiu honrosos títulos de nobreza. Hoje, é nessa ilha que nos refugiamos para não morrer de saudade.

Como está o processo para se criar a Fundação Benito Barros? Como será essa entidade?
Regina Barros: Na verdade, Alex, a Fundação Benito Barros ainda não passa de um sonho. O que existe de concreto é um grupo de amigos que defende a criação de uma entidade que possa preservar a memória de Benito na cidade que ele tanto amou. Esse, sem dúvida, era o desejo dele. Tenho depoimentos de várias pessoas às quais ele revelou a intenção de criar uma Biblioteca que se chamaria Américo de Oliveira Costa. A família de Benito é sensível a idéia, mas isso leva um tempo para o amadurecimento e levantamento das reais possibilidades não apenas da criação, mas de manutenção. Evidentemente, essa não é uma tarefa tão fácil, mas vamos tentar. Por enquanto, posso dizer que bem ao estilo do nosso amado Bena I e Único, está criada a Casa Imperial da Casqueira – Sociedade dos Amigos de Benito, com o objetivo de agregar todos os súditos na reconstrução do glorioso Sólio Imperial. Todos os que amavam Benito estão convocados.

Como surgiu a idéia de fazer o Dia de Benito? Quem está ajudando nessa empreitada?
Regina Barros: A idéia dessa celebração, devo dizer, é pura invenção de Dorotéa Dantas, nossa querida cigarra, que se desmanchava de amores pelo Imperador mesmo sem ele dar muito cabimento. Logo nos primeiros dias após sua morte ela chegou chorosa me conclamando para fazer uma homenagem a Benito na data do seu aniversário. Segundo ela, Tiradentes que nos perdoe, mas 21 de Abril agora é Dia de Benito na Terra do Sal. Fomos então reunindo diversos amigos em torno da idéia que foi acolhida e está dando certo. Na colaboração direta para a realização do evento podemos citar Djane, Daniel Násser, Chico Paraíba, Hailton Marques, Jorge Luiz, Batelão, Fernando Lopes, Daniel Dantas,Vilma Pinheiro, Manolo, Zé Antonio Menezes, Genival, Haroldo, Melo, Marquinhos Show, Fábio da Filarmônica, Marcos Oliveira, João e Celso Evangelista, Isabel Pelinca, João Vicente, Cláudio Guerra, Rosário Guerra, Giovana Paiva, Elson Biô, Reginaldo, Edinho, Silvinha e Aleuda Santos, além, claro, dos familiares de Benito. Teremos então um dia inteiro para celebrarmos a memória de Benito, começando alegremente nas primeiras horas com uma alvorada pela Banda de Música. Logo cedo levaremos flores para o Imperador em sua nova morada. A partir do meio dia a festa “Naquela Mesa tá Faltando Ele”, no Café da Djane, com exibição de vídeos e fotos do homenageado. Às 16 horas, na Coluna da Praça a homenagem pública com música, poesia, documentário, depoimentos em honra da memória desse querido filho da terra salineira. Não sou habituada a organizar eventos, por isso convoco a todos que desejarem que, por favor, se engajem na organização dessa festa. Agradeço sua colaboração, Alex e a todos os blogueiros que se empenham na divulgação do Dia de Benito e aproveito para convidar toda Macau.

3 comentários:

  1. Bom Dia à todos! Sou José Neilson Macauense genuíno, concordo no dia 21 de Abril e, também, na Fundação Benito Barros. Nas minhas idas à Macau, onde, ressalvo sou filho de Nilza, cuja, a amizade entre Benito e Nilza tinham laços muito fortes e apaixonantes. Como de costume estava ele lá em sua Lanchonete com sua cerveja apreciando a brisa do vento embaixo de uma tenda na entrada de Macau. Ele ressoava suas poesias sempre aos sons espiradores de suas músicas baseado nos clássicos da MPB. Ele falava muito da Biblioteca desde algum tempo esta lá desativada, então, uma vez o questionei: "constrói uma e coloca o seu nome como fundador, sabe, qual foi a resposta? Ele, disse: - Omi... Vai te lasc... Kra... seu gal...", ao mesmo tempo, repercutia sobre as árvores que estavam sendo arrancadas pela governança da cidade, Benito não apreciava esta decisão da Prefeitura. Nossos raros encontros eram sempre divertidos e acolhedores, onde, na maioria eu era mais ouvinte. Bem, é isso! Fico feliz em poder contribuir de qualquer forma a essa Fantástica figura chamada Benito Barros. Sou José Neilson e retrato um pouco sobre Nossa História Macauense no Blog: http://ilhademacaurn.blogspot.com onde Benito Barros foi o Mentalizador e Materializador do meu Web Site. Obrigado!

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  2. Benito era ao mesmo tempo nosso Rimbaud e nosso Nietzsche. A grande aspiração de Nietzsche era casar com Lou Andreas salomé. A de Benito, era uma escola modelo, de padrão internacional em Macau. Uma sífilis contraída em 1866, pois fim ao sonho de Nietzsche. Um sonoro não de Zé Antonio, pois fim ao sonho de Benito contar com o município para aquela empreitada maluca. Ambos entregaram-se ao sofrimento. Nietzsche, passou os últimos anos de sua vida recluso. Benito entregou-se a solidão, ao sofrimento, a cerveja, ao cigarro, aos livros. Assim como Nietzsche, Benito era emotivo e fascinado por tudo que resplende a vida, era ao mesmo tempo sedento por liberdade espiritual e intelectual; levado pelo extinto ao mundo irreal, ao mesmo tempo era apegado ao mundo concreto e real. Crítico feroz de toda fraqueza humana; conhecedor de si mesmo, era seu próprio algoz. Assim era Benito Maia Barros. Assim era Friedrich Wilhelm Nietzsche.

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  3. um CARAI daquele....inventa de morrer logo agora!!!!

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